Minha chegada à Espanha foi tranquila. Não me refiro a parte aérea e sim a parte terrestre pois o gerente da equipe do Playas de Castellón, Manolo Pesudo, foi me buscar no aeroporto de Valencia com seu Golf branco que nunca mais esquecerei. No trajeto Valencia-Castellón entre nosso bate-papo sobre atletas que trabalharam comigo e que jogaram no Playas também (Cacau e Neco) notei que o velocímetro beirava os 160km/h. Além disso o Manolo gostava de ultrapassagens "com emoção". Na Europa as autopistas são um convite para altas velocidades. Castellón é uma província cuja capital é Castellón de la Plana, sede do Playas, que pertence a província de Valencia. Cheguei no ginásio, vindo direto do aeroporto, num sábado a tarde e fui apresentado ao grupo. Eu fui cerca de uma semana depois da apresentação pois fiquei no Brasil dando entrada no visto de trabalho junto ao Consulado Espanhol no Rio de Janeiro. A primeira coisa que chamou a atenção foi a imponência do ginásio Ciutat de Castelló (foto acima) que tem capacidade para 6.000 pessoas sentadas. O ginásio poliesportivo pertence a prefeitura e dentro possui enfermaria, sala para controle anti-doping, vestiários amplos, todo o tipo de material (cones, bolas, arcos, etc.) e uma sala de musculação precária. Além do Playas, equipes profissionais de handebol e basquete também treinam e jogam lá. Essa é uma característica das equipes espanholas. Quase nenhuma possui ginásio próprio. Os clubes em termos de estrutura física se resumem a uma sede (escritório). Porém, diferente do Brasil, os ginásios de prefeituras por lá são espetaculares.
O principal patrocinador da equipe era a empresa Macer cujo presidente Augustín Poyatos era o manda-chuva da equipe. Na hierarquia da equipe e da empresa vinha o Pepe Miquel (vice-presidente) e depois o Manolo. Curioso é que este esquema é praticamente igual ao que acontece aqui no Carlos Barbosa.
A recepção do grupo foi ótima. Após o treino fui levado pelo gerente até a sede e recebi todo o material de treino e viagens. Era muita roupa. Eu ainda receberia mais a frente os agasalhos para o inverno. Outra diferença por lá é que tanto atletas como comissão técnica levam seu material para lavar em casa. Cada um é responsável por suas coisas. Exceto material de jogo que era levado pelo roupeiro Augustín, um senhor de idade muito simpático e que me ajudou muito por lá, para a lavanderia. No Brasil os atletas tem a cultura de esperar que o clube faça tudo por eles. Isso é uma herança negativa que herdamos do Futebol. No futuro haverá um post sobre este tema.
Havia muito trabalho pela frente. As informações que eu e o Padú (treinador brasileiro que vive há mais de 15 anos na Espanha) tínhamos era que o Playas era um time que chegava nos últimos anos na competições sempre como favorito mas que na hora H não vencia. O clube naquela temporada 1999-2000 tinha um dos maiores orçamentos (senão o maior) da División de Honor (1ª divisão) e tinha sido eliminado na semifinal da Liga nacional na temporada anterior pelo Industrias García (hoje Marfil Santa Coloma), uma equipe com orçamento muito inferior.
No Brasil temos o hábito de querer vencer sempre mesmo estando em equipe de porte inferior. No Playas estava impregnado o "medo de vencer". Pronunciar o nome "Boomerang Interviu" provocava calafrios em muitos da equipe, principalmente em membros da diretoria. O Interviu era considerado carrasco do Playas. Isso estava no ar e neste aspecto começou a aparecer o brilho do Padú como treinador. A história iria mudar...
Depois de ir até a sede do clube, o Padú me levou para almoçar quase as quatro da tarde. Estava faminto ! Finalmente fui para o apartamento. O Playas tem uma organização ótima quanto a moradia. Todos os atletas moravam em um condomínio bem confortável com piscina na mesma rua do ginásio. De casa até o local de trabalho não dá nem 2 minutos andando. Eu também morava lá. Só o treinador que normalmente mora em outro apartamento mas que ficava em frente ao condomínio. O Playas pagava aluguel e todas as contas do ap. (exceto telefone). Isso já vinha em contrato e dava uma segurança e alívio pois o salário entrava "limpo".
Depois de me deixar no apartamento o Padú me deixou descansando e avisou que voltaria a noite a fim de irmos jantar. No verão Castellón vira uma verdadeira cidade fantasma. Alguns estabelcimentos comerciais chegam a fechar o mês inteiro. Eu tive a péssima idéia de dormir um pouco pois o jet leg havia pegado firme. Eu durmo muito pouco em viagens. Não por medo e sim porque simplesmente não consigo. Pois é, o Padú não apareceu e eu apaguei. Acordei no meio da madrugada literalmente sem saber se estava no Brasil ou se a Espanha era só um sonho. Totalmente grogue olhei no relógio e vi que marcava duas da manhã. Pensei: Já era ! o cara veio aqui e eu apagado não ouvi o interfone. Tentei dormir e não consegui mais. Bateu a fome e o desespero pois dentro de casa não havia quase nada para comer. Arrisquei ir no ap. do Padú mas eu nem sabia o número. Quando olhei no interfone "1º direita, 2º izquierda..." Ferrou ! Após acordar uma moradora e arranhar um portunhol descobri o ap. do Padú que não estava em casa ! Que ótimo... eu com fome e sem moeda espanhola no bolso (peseta na época). Voltei pra casa e para minha sorte havia na geladeira um pouco se salsicha e pão. Isso foi o que sobrou do antigo morador (um goleiro que foi fazer teste no clube) e foi o que eu comi. Mais tarde eu descobrira o porque do sumiço Padú. infelizmente essa eu não posso contar...
No próximo post continuarei falando sobre minha jornada em terras espanholas.
Hasta Luego !
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